Notícias
22/09/2022
SVB Entrevista: Rodrigo Lima – vocalista Dead Fish
Compartilhe
– Há quanto tempo você é vegetariano? Como foi o período de transição?
Fui ovolactovegetariano por 26 anos e não me lembro de ter tido um período de transição, aos 17 anos, depois de passar mal com uma comida feita pela minha avó, tornei-me vegetariano, caí algumas vezes em Natais e comi camarão ou bacalhau para meio que não fazer desfeita para minha avó, que morava com minha família e, para ela, a comida típica do meu estado (ES) era algo como uma oferenda dos deuses e uma baita desfeita um filho da terra recusar, era complicado, mas, tirando essas poucas vezes e uma num restaurante em Natal, com minha banda, não me lembro de um período de ir tirando os bichos do cardápio não.
Desde o ano passado quando descobri que minha filha era uma menina num ultrassom, sou vegano. Um ano e alguns meses.
– Qual a principal causa que lhe fez se tornar vegetariano? A causa ambiental, animal ou alimentar?
Foram várias, a imediata foi saúde mesmo, eu não me dava bem com aquelas comidas todas, principalmente com carne vermelha, era comer uma feijoada e passar mal. Quando me tornei adolescente, fiquei lotado de acne e diziam que era por conta do chocolate e todo aquele papo, o que me lembro é que, meses depois de parar de comer carne, a minha pele simplesmente parou de ter aquela quantidade brutal de acnes, nem sei se tem uma ligação direta com ter me tornado vegetariano, mas lá no começo associei muito.
Estou envolvido com o punk e o hardcore desde os 13 anos de idade, quando comecei a andar de skate e conhecer bandas. Dessas bandas vieram os selos, as ideias e os zines e, nestes, eu passei a conhecer um mundo bem diferente daquele que meus amigos de colégio viviam, passei a conhecer bandas do mundo inteiro, a entender posturas políticas que não apareciam nas revistas comuns e, também, passei a ler sobre ecologia. Li muitos zines que falavam de vegetarianismo como uma saída para um mundo mais viável, com menos fome, menos destruição da natureza e esse, também, foi um dos motivos que me fez ter a certeza que era uma escolha certa ser vegetariano.
– Qual a sua principal satisfação em ser vegetariano?
Hoje, para mim, é uma questão ética, no meu ponto de vista, não é nada ético, nem inteligente, comer bichos e seus derivados. Para mim, é parte de uma postura política, é parte de uma revolução em andamento diariamente e isso me traz muito mais otimismo. Sinto-me menos cínico, mesmo que viva num país que vive um golpe e tenta adotar um modelo de economia de mercado estúpido e ultrapassado, que é esse tipo de capitalismo que a Veja e a Globo tentam nos vender. Enfim, não tenho dúvidas que fiz escolhas que me tornaram um ser humano melhor e isso me dá força e autoestima para dizer não ao senso comum. Tenho a clara certeza que estou do lado certo com minhas escolhas de vida.
– Como seus amigos e parentes lidaram depois que você se tornou vegetariano?
Cada um reagiu de uma forma, meus irmãos me criticam até hoje e fazem piada e tudo mais, meus pais nunca aceitaram bem, minha avó, parecia que eu tinha me tornado o maconheiro da família hahahahaha, eu era uma decepção! Os meus amigos de infância acharam curioso e, também, fizeram piada, meus amigos de faculdade sempre foram curiosos quanto à minha postura, respeitaram bastante, na banda, sempre me respeitaram muito, já tivemos membros vegetarianos além de mim por muito tempo, mas sempre fizeram piada também, só que a pizza vegetariana do cattering sempre acaba primeiro até hoje. Aprendi a ter argumentos para todos os meios, aprendi a rir disso, poucas piadas idiotas me tiram do sério e, no fim das contas, todo mundo fica meio tocado e vem com aquele papinho de que não come muita carne, que não gosta muito e blá blá blá.
– Você gosta de cozinhar? Quais receitas você costuma preparar?
Sim, bastante, cozinho desde que me tornei vegetariano, depois que fui morar só, passei a cozinhar mais ainda.
Acho que se não estivesse numa banda estaria numa cozinha, como meu amigo André Vieland, que está em ambos os meios, já fui funcionário dele no Vegacy por mais de um ano e foi uma experiência muito boa.
Eu cozinho quase tudo, faço homus, berinjela de quase todos os jeitos, sei fazer coisas com soja, apesar de nunca ter me dado bem com ela a vida inteira. Sei fazer hambúrguer de todos os jeitos e tipos, sei fazer falafel, faço glúten, e erro muito fazendo, e sei fazer uns pratos com ele, enfim, acho que só não sei fazer aquelas tortas brutais que vejo esses chefs fazendo, o resto até que não mando mal.
– Sua visão sobre o mundo mudou depois que você se tornou vegetariano?
Bastante, porque passei a incluir outras espécies como tendo direitos. Eu sempre falo que direito dos animais é direito humano, é libertação humana também.
– As pessoas normalmente atacam as outras por simples falta de informação. Como você lida com opiniões alheias?
Já fui mais agressivo, hoje, vejo esses ataques mais como defensivos do que realmente um ataque. Essa ironia cínica dos carnívoros devotados nada mais é do que culpa cristã embaixo de pilhas de picanha maturadas hahahahaha. Eles sabem que vão ter câncer de tanto comer o que o organismo não é feito para digerir. Eles ficam bravos quando a gente escolhe não ficar doente como eles e eles não admitem isso.
– Quais são as perguntas que mais lhe fazem?
São muitas, talvez, as mais comuns, hoje, são como eu consegui chegar aos 43 anos com energia para estar numa banda de hardcore e ainda vestir a mesma bermuda por 20 anos, eu respondo que o vegetarianismo, pouco ou quase nenhum trabalho alienado e banho frio ajudaram bastante. A segunda é aquela cretina que todo mundo ouve, de como eu faço para obter proteína, para viver, às vezes, nem respondo a essa, às vezes, falo sangue, sangue humano.
– Deve ser difícil conciliar sua rotina de shows com a sua alimentação. Como você lida com essa questão?
Sempre foi complicado estar na estrada e ser vegetariano, desde sempre, também, por conta dos horários sempre corridos. Já passei muitos apertos em muitos lugares, o que me fez adquirir uma rotina para não ficar tempo demais sem comer. O que eu faço é sempre levar um pote de castanhas e frutas para as viagens mais longas.
Antes de ir para qualquer lugar, sempre pergunto para os amigos locais onde tem um restaurante que eu possa comer, ou procuro na internet. Depois do show, sempre estou faminto e peço para pedirem frutas e talvez pizza vegan ou homus.
– Qual receita você gosta de fazer e indica para a gente?
Eu gosto de cozinhar berinjela de quase todos os jeitos.
Berinjela refogada
Ingredientes
1 berinjela grande
1 cebola roxa cortada em cubos
1 colher (sobremesa) de alho esmagado
4 colheres (sopa) de azeite de oliva
Sal a gosto
Ervas-finas e temperos a gosto
Modo de preparo
– Pique a berinjela e o pimentão em cubos e reserve;
– Em uma panela, coloque o azeite e refogue a cebola e o alho, acrescente a berinjela e o pimentão e mexa, coloque a água e deixe cozinhar até a berinjela estar pronta;
– Desligue o fogo e acrescente os demais ingredientes, espere esfriar e leve à geladeira.
– Qual mensagem você deseja passar para as pessoas que não fazem ideia do que acontece no mundo?
Durante um tempo, quem dominava o mundo era quem tinha mais terra, depois, quem tinha mais posses, grana, imóveis, gado. Estamos na era da informação, mesmo que a gente aqui no Brasil ainda pareça estar vivendo no feudalismo, muito Pré-Revolução Industrial. Enfim, ser informado é ser poderoso, informe-se do que se passa para que você tenha um prato de comida na sua frente. Isso vai fazer toda a diferença, pode apostar.