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20/04/2024

Afinal, o consumo de carne de frango é sustentável?

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A produção industrial de frango, impulsionada pela alta demanda por carne barata e acessível, tornou-se um gigante global, mas com um custo socioambiental alarmante. Contrariamente à crença popular, o frango não é uma escolha alimentar sustentável.

A carne bovina é, indiscutivelmente, a maior contribuidora para as emissões de gases do efeito estufa (GEE) entre todos os alimentos consumidos pelos humanos. Ela necessita de sete vezes mais terra e produz sete vezes mais emissões de GEE que o frango por grama de proteína. Em resposta às crescentes preocupações com o impacto ambiental da carne bovina, algumas pessoas sugerem o consumo de frango como uma alternativa mais amigável ao clima. No entanto, ao nos concentrarmos apenas nos danos causados pela produção de carne bovina, podemos ter uma tendência a ocultar o fato de que a produção de frango também apresenta vários riscos ambientais, éticos e de saúde.

Imagem: Fazenda industrial de frangos
Fonte: The Human League (2021)

No que diz respeito aos riscos ambientais, o argumento para consumir mais frango é geralmente baseado unicamente nas emissões de gases de efeito estufa. Embora essas emissões sejam inferiores às de outras carnes, o frango emite cerca de 9.8kg CO₂e/kg. Ou seja, tem emissões muito mais altas do que proteínas de origem vegetal, tais como lentilhas (1.15kg CO₂e/kg), grão de bico (0.39kg CO₂e/kg) e feijões (1.17kg CO₂e/kg).

Em todo o mundo, o consumo de frango disparou nos últimos anos, saltando de 6,5 bilhões de frangos consumidos em 1960 para 75,2 bilhões em 2022. Foram cerca de 140 mil frangos mortos por minuto em 2022. A maioria desses animais é criada em fazendas industriais intensivas, onde recebem ração processada e concentrada, composta principalmente de soja. O Brasil, maior produtor de soja do mundo, é responsável por fornecer 42% da produção mundial deste grão. Na última década, a área ocupada por soja no Brasil quase triplicou, saltando de 13,4 para 34,2 milhões de hectares. No Brasil, a maior parte da soja é cultivada no estado do Mato Grosso, onde predominam os biomas Amazônia e Cerrado. Esta região, que até recentemente era composta de florestas ou savanas, agora está se convertendo em vastas plantações de soja graças ao desmatamento associado ao cultivo desta commodity. Pesquisas indicam que, no Mato Grosso, 20% de todo o desmatamento, entre 2008 e 2019, ocorreu em propriedades com cultivo de soja.

Ao contribuir para o desmatamento da Amazônia e do Cerrado, a indústria da soja (e, portanto, da carne) está contribuindo diretamente para a crise climática, a perda da biodiversidade, a alteração do ciclo hidrológico, e a degradação do solo. Além disso, compromete serviços ecossistêmicos fundamentais para o bem-estar humano e degrada as condições de vida necessárias para a sobrevivência de comunidades tradicionais. Cerca de 80% da produção global de soja é utilizada para alimentar animais, sendo que metade disso é destinada para a alimentação de frangos. Tem-se, portanto, dimensão do impacto ambiental que a indústria da carne de frango gera a partir da sua alta necessidade de consumo de soja.

Outro aspecto ambiental importante a ser discutido está relacionado às milhões de toneladas de esterco de frango produzidos anualmente. O esterco de frango contém de 2 a 4 vezes mais nutrientes, principalmente nitrogênio e fósforo, em comparação ao esterco de outros animais. Tais condições propiciam a liberação de óxido nitroso (N2O), um gás causador do efeito estufa 300 vezes mais potente que o dióxido de carbono (CO2) no aquecimento do planeta. Além disso, assim como o CO2, o N2O tem uma longa permanência, durando em média 114 anos na atmosfera antes de se desintegrar, contribuindo para a destruição da camada de ozônio.

O esterco de frango também é particularmente prejudicial aos cursos de água. Quando esses nutrientes em excesso são levados para riachos, rios e outros corpos d’água, podem causar poluição ambiental. Isso ocorre porque os nutrientes extras na água desencadeiam uma reação em cadeia chamada eutrofização. Este processo acelera o crescimento de algas, podendo resultar em perda significativa de vida aquática e até na formação de zonas mortas. Com mais de 70 bilhões de frangos sendo abatidos anualmente para consumo, tem-se a dimensão do problema gerado.

Quanto aos riscos à saúde, estes se relacionam ao aumento da produção de frango através de maior intensificação de sua produção. Essa é uma resposta tradicional para reduzir o impacto ambiental da carne. Contudo, os riscos à saúde são um efeito colateral inevitável. Doenças zoonóticas provenientes do confinamento em massa de animais são uma das principais preocupações nesse cenário, podendo levar à disseminação de doenças e pandemias, como a gripe aviária.

O uso contínuo de antibióticos em animais de criação industrial está levando ao surgimento de várias bactérias resistentes, o que torna muitos antibióticos ineficazes. Pesquisas mostram que a pecuária intensiva, que consome 75% da produção mundial de antibióticos, está propensa a produzir bactérias resistentes a medicamentos. Muitos animais, incluindo frangos, são expostos ao uso imprudente de antibióticos para estimular o crescimento rápido e ocultar questões de bem-estar animal. Como consequência, aproximadamente 1,27 milhão de pessoas morrem todos os anos de infecções resistentes a antibióticos. É previsto que este número possa chegar a 10 milhões até 2050.

Crédito: C.Lotongkum / Shutterstock.com

Considerando os diversos impactos negativos da produção e consumo de frango, o veganismo se apresenta como uma alternativa viável e necessária para construir um futuro mais sustentável, ético e saudável. Adotar uma alimentação baseada em vegetais contribui para a mitigação das mudanças climáticas, a preservação do meio ambiente, a promoção da saúde pública e o bem-estar animal.

Autora: Julia Lopes
abril/24

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